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sábado, 22 de dezembro de 2012



HAICAIS

Séculos antes da invenção das máquinas fotográficas, os japoneses  já eram mestres na arte de fotografar. Fotografavam sem máquinas. Para isso usavam palavras. Suas maravilhosas miniaturas fotográficas feitas com palavras têm o nome de haicais. Quem lê um haicai vê. São tão pequenos - mas pesam tanto! Leminski, valendo-se de uma sugestão de Jorge Luis Borges, descreve um haicai como um objeto poético mínimo de peso intolerável. Não tente entender. Você entende um pôr do sol? Um pássaro em voo? Um sorriso da pessoa amada? Não são para ser entendidos. São para ser visto. O prazer do que se vê está no ato de ver e não no ato de pensar sobre o visto. Os pensamentos prejudicam a visão. Não foi à toa que Alberto Caeiro afirmou que "pensar é está doente dos olhos". Quem lê um haicai fica curado dos olhos por nos obrigarem a não pensar. Veja esse haicai: "Na velha casa que abandonei as cerejeiras florescem". Acabou. É só isso. Agora, sem ser levado pelo desejo de compreender, entregue-se à visão. Veja a casa velha. A casa que abandonei. Passei por ela. Triste solidão. Os muros estão caídos. O jardim de outrora se transformou num matagal. As paredes estão descascadas. Mas, a despeito desse abandono, as cerejeiras florescem... As cerejeiras são fiéis. Pode-se confiar nelas...
                                                                                      Rubem Alves

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